Projeto piloto do G9 “Gestão compartilhada do saneamento em Quilombos no Vale do Ribeira-SP” atende novo marco legal do Saneamento

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Este artigo é parte integrante da Edição 87 da Revista Saneas. Para ler a revista, acesse https://www.saneasonline.com.br/edicoes/edicao-87-marco-legal-do-saneamento-impactos-e-oportunidades-quatro-anos-apos-sua-aprovacao/

A partir da atualização do marco legal do saneamento (Lei 11.445/2007) ocorrido em 2020 pela Lei 14.026, a população rural passou, obrigatoriamente, a ser incluída no cálculo do índice de atendimento dos serviços de saneamento, com meta de universalização até 2033. Esse fato permite supor que na próxima década o país vai ter de resolver o déficit com o saneamento rural, implantando cada vez mais soluções alternativas de abastecimento de água e esgotamento sanitário adequadas a esta realidade.

Já existem, em todo o país, ações isoladas voltadas ao abastecimento de água, tratamento de esgotos sanitários e coleta de resíduos sólidos para moradias em meio rural, principalmente por meio de fornecimento de poços semiartesianos e fossas sépticas. Algumas destas ações são exitosas, mas muitas delas acabam por não cumprir o seu propósito, mostrando que entregar a instalação de banheiros ou de fossa séptica não é suficiente. As principais causas de insucesso dos projetos implantados estão associadas ao abandono por parte dos moradores, operação inadequada e falta de manutenção e de pessoas habilitadas para resolver pequenos reparos. Tonetti et al (2018) pondera que

Tecnologias implantadas “de cima para baixo” por programas governamentais ou projetos de pesquisa quase sempre são abandonadas pela população ou têm o seu funcionamento muito prejudicado pelo seu desinteresse ou pela falta do conhecimento necessário para a manutenção do sistema (TONETTI et al., 2018, p. 41).

A análise dessas situações trouxe reflexões e direcionou para a formação do G9 – Grupo de Especialistas em Saneamento (oriundas da Sabesp) com  09 (nove) propósitos:

1-Atuar na expansão do direito humano de acesso ao saneamento básico,

2-Priorizar o Saneamento Rural,

3-Estimular a gestão compartilhada,

4-Promover o exercício da cidadania

5-Desenvolver práticas sustentáveis,

6-Propiciar e atuar com resiliência,

7-Fomentar o desenvolvimento econômico local,

8-Estimular a resistência e a preservação dos territórios e

9-Atuar com respeito às peculiaridades locais. 

O G9 considera a legislação vigente e com base em pesquisas identificou a potencialidade de implantação de um projeto piloto de saneamento em comunidades quilombolas localizados no Vale do Ribeira. Estudou e avaliou as características e a conjuntura atual de demanda de saneamento básico na região que apresenta um dos menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do estado de São Paulo.

Com o objetivo de buscar caminhos para o atendimento das metas estabelecidas pelo novo marco do saneamento (Lei Federal nº 14026/21), o G9 adotou o programa exitoso de Gestão Compartilhada, referência SISAR – Sistema Integrado de Saneamento Rural, em expansão no Ceará, Pernambuco, Central da Bahia e Piauí.

O município de Eldorado tem 13 Associações remanescentes quilombolas reconhecidos (ITESP, 2018) e o projeto piloto contempla cinco Quilombos: André Lopes, Galvão, São Pedro, Poça e Pedro Cubas.

As cinco comunidades quilombolas foram selecionadas para o projeto piloto porque estão organizadas em associações e porque nelas está em instalação o sistema de abastecimento de água através de poços semiartesianos e rede implantados pela Prefeitura com recursos da FUNASA.

O projeto piloto viabilizou a implantação de unidades sanitárias individuais, onde possível tecnicamente, com recursos da Secretaria de Estado de Meio Ambiente, Infraestrutura e Logística – SEMIL – no âmbito do Programa “Água é Vida”, efetivados através de Convênios assinados com a Prefeitura de Eldorado. Especialmente a comunidade André Lopes, em virtude da topografia e distribuição das moradias no território, não foi recomendada para implantação de USIs; nesse caso, a UFABC está detalhando uma proposta de projeto para uma estação de tratamento dos esgotos sanitários e respectiva rede de coleta. A fig. 1 apresenta imagem google com a localização e dados dos 05 quilombos do projeto piloto.

Outro aspecto peculiar do projeto piloto refere-se a forma de atuação em comunidades quilombolas. A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho garante às comunidades quilombolas o direito de serem consultados de maneira livre, prévia e informada sempre que possa existir uma intervenção que afete os modos de vida. Estabelece ainda que a consulta deverá respeitar as formas de tomada de decisão e organização social (OIT, 1989).

Com base nestes direitos, a Equipe de Articulação e Assessoria às Comunidades Negras do Vale do Ribeira SP/PR (EAACONE) com a participação das lideranças de todos os quilombos da região, produziu e editou o “Protocolo de Consulta Prévia dos Territórios Quilombolas Vale do Ribeira – SP”. O documento contempla o seguinte:

Queremos ser consultados de maneira livre, prévia e informada. Queremos ser respeitados dentro de nossas especificidades culturais, queremos ser consultados com antecedência quanto a medidas ou atos administrativos, legislativos, bem como empreendimentos que venham afetar direta ou indiretamente os nossos territórios, sejam elas na esfera municipal, estadual ou federal (EAACONE, 2022, p. 15).

O G9 considera a necessidade de envolvimento da comunidade e busca processos e tecnologias de baixo custo e alta eficiência, que possibilitem que a solução seja pactuada com a população beneficiada. A proposta está em consonância com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) fomentando prioritariamente os ODS: 03- Saúde e Bem -estar; 04- Educação de Qualidade; 06- Água Potável e Saneamento; 08 –  Trabalho Decente e Crescimento Econômico e  12-Consumo e Produção Responsáveis.

As soluções, ações realizadas e em andamento,  previstas pelo G9 estão sendo viáveis em parceria e apoio da Prefeitura da Estância Turística de Eldorado,  Cia de Saneamento básico do estado de São Paulo- Sabesp, Coordenadoria de Saneamento Básico do estado de São Paulo/Secretaria de Meio Ambiente , Saneamento e Logística do estado de São Paulo – CSAN/SEMIL, Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo – ITESP , Universidade Federal do ABC – UFABC e apoio da Associação dos Profissionais Universitários da Sabesp – APU.

Em abril de 2023, teve início à instalação de USIs nos Quilombos Poça, São Pedro e Galvão, como mostra a Figura 2. Cabe mencionar que estas USIs foram licitadas pela Prefeitura de Eldorado após ação conjunta e voluntária de Parceiros G9 – Voluntariado Sabesp, ITESP, FF, UFABC, EAACONE e líderes comunitários – para realização do mutirão para o cadastramento sanitário domiciliar necessário à solicitação de financiamento realizado em um final de semana.

Figura 2: instalação das USIs no Quilombo São Pedro, em abril de 2023
Autoria: Gabriel Fusco – Eldorado

Em dezembro de 2023, o G9 com o foco no acompanhamento e uso correto das infraestruturas de saneamento instaladas e/e em implantação, organizou e programou a realização de Rodas de Conversas com 05 temas e elaborou cartilha com textos simples, didática ,com fotos, imagens que demonstram os assuntos apresentados ,discutidos e esclarecidos durante as Rodas de Conversa. A Figura 3, apresenta os temas previstos e datas dos eventos realizados e previstos. As figuras 4 e 5, são fotos de algumas Rodas de Conversa nos quilombos Galão e São Pedro.

Fig.3- temas e eventos realizados e previstos

QUILOMBO GALVÃO

QUILOMBO SÃO PEDRO

Fig.4- e Fig.5 –  Cartilhas entregues e momentos das Rodas

O G9 contribui para a implantação de infraestruturas, quer apresentar cenários, formular propostas de modelos de gestão compartilhada dos serviços de saneamento rural no estado de São Paulo, considerando resultados de projeto piloto em implantação em cinco comunidades quilombolas no município de Eldorado e principalmente busca implantar processos para gerar renda para a comunidade beneficiária.

Os próximos passos visam o direcionamento e metas para efetivar estudos das despesas operacionais (opex) para definição da tarifa dos serviços de saneamento na gestão compartilhada em quilombos, incluindo:

  • Realizar estudos para destinação/disposição adequada de resíduos gerados nas USIs, ETEs e ETAS em operação nos quilombos do projeto piloto do G9, dentro da Economia Circular. Buscar parceria com a UNESP de Registro, UFABC e utilizar o lodo como substrato para plantações de bananas locais e produzir artesanatos com as hastes de taboa (planta regional ) que irá depurar Matéria Orgânica no SbN proposto.
  • Estudar a redução do valor de tarifas de consumo de energia elétrica nas infraestruturas operacionais de saneamento instalados.
  • Estudar a implementação do Plano de Segurança da Água (PSA).
  • Estudar as “retrofits” dos sistemas de abastecimento de água implantados.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

APU – Associação dos Profissionais Universitários da Sabesp. Roda de Conversa: Parcerias e Solução para o Saneamento de Quilombos no Vale do Ribeira (SP) – G9 – APU. 30/nov/2022.  Seminário. Disponível em: https://www.youtube.com/results?search_query=apu+saneamento . Acesso em: 17 jun.2023

BRASIL. Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007.  Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico. Diário Oficial [da] República Federativa. Brasília, 2007. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/…

BRASIL. Lei nº 14.026, de 15 de julho de 2020. Atualiza o marco legal do saneamento básico. Diário Oficial [da] República Federativa. Brasília, 2020. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l14026.htm

EAACONE – Equipe de Articulação e Assessoria às Comunidades Negras do Vale do Ribeira SP/PR. Protocolo de Consulta Prévia dos Territórios Quilombolas. Vale do Ribeira – SP. 2020

ITESP –  Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo “José Gomes da Silva”. São Paulo (Estado). Comunidades remanescentes de quilombos no estado de São Paulo. Mapa. 2018. Disponível em file:///C:/Users/rodri/Documents/…. Acesso em: 22 jun.2023.

KITAHARA, E. K. I.; RODRIGUES, V.L. Gestão compartilhada do saneamento em municípios de São Paulo – É viável? – Proposta In: Engenharia, Gestão e Inovação.1ª ed.Belo Horizonte: Editora Poisson, 2022, v.2, p. 164-173.

SÃO PAULO (Estado). Decreto Nº 57.479, de 01 de novembro de 2011. Institui o Programa Estadual Água é Vida para localidades de pequeno porte predominantemente ocupadas por população de baixa renda e dá providências correlatas. São Paulo, 2011. Disponível em https://www.al.sp.gov.br/…

SILVA, F.A. et all. Sistema Integrado de Saneamento Rural (SISAR) em Quilombos da Estância Turística de Eldorado – Vale Do Ribeira – SP. v.5. Ed.Piracanjuba-GO: Editora Conhecimento Livre, 2023, p. 244-257.

SISAR. Sistema Integrado de Saneamento Rural. Site. Disponível em http://sisar.org.br/institucional/#quem-somos \. Acesso em 21 jun.2023.

Currículo Integrantes do G9 

Química ALZIRA AMÂNCIO GARCIA 

  • Bacharel em Química 
  • Pós-Graduação : Gestão Ambiental , Sociopsicologia, Gestão de 3º Setor , Voluntariado Empresarial , Sustentabilidade e Responsabilidade Social 
  • Trabalhou 43 anos na Sabesp, nas áreas de controle sanitário, Responsabilidade Socioambiental, Educação Ambiental e gestão de resíduos sólidos. 
  • Educadora Ambiental com ênfase em Consumo Sustentável 
  • Presidente da Associação dos Especialistas de Saneamento (AESAN); Diretora de Saúde e Serviço Social da Associação dos Aposentados e Pensionistas da Sabesp (AAPS) 

Engª ANA LÚCIA BRASIL 

  • Formada em Engenharia Civil e em Engenharia Sanitária 
  • Trabalhou na Companhia Estadual de Água e Esgotos do Ceará – CAGECE e, depois, na SABESP. 
  • Foi Coordenadora de Saneamento da Secretaria Estadual de Saneamento e Energia 
  • Atualmente faz parte da Diretoria da ABES Seção São Paulo e é coordenadora da Câmara Técnica de Saneamento e Saúde em Comunidades Isoladas – CTCI da ABES-SP 
  • Colaboradora no livro Tratamento de Esgotos Domésticos em Comunidades Isoladas elaborada pela Unicamp e ABES/SP 

Engª ELIANA BOA VENTURA 

  • Engenheira Química com pós-graduação em Tecnologias Ambientais, Administração e MBA em Saneamento Ambiental. 
  • Trabalha na Sabesp desde 1997. Atuou em operação de Estação de Tratamento de Esgoto, controle de processos, qualidade e manutenção produtiva total. 
  • Está na Auditoria Interna da Sabesp desde 2005 onde iniciou desenvolvendo trabalhos de Auditoria Operacional na área comercial, de gestão de pessoas e Lei Sarbanes Oxley. 
  • Atualmente trabalha no departamento de Auditoria de Engenharia e Ambiental, desenvolvendo trabalhos na área ambiental. 
  • Avaliadora de trabalhos técnicos da área ambiental para a Congresso Brasileiro de Engenharia Sanitária e Ambiental desde 2017 
  • Foi membro da Comissão Executiva Central dos Educadores da Seicho-No-Ie do Brasil por mais de dez anos e atuou em trabalhos voluntários na área de educação. 

Engª ELIANA KITAHARA 

  • Formada em Tecnologia Sanitária, Engenharia civil e especialização em Saúde Púbica e Ambiental / Gestão Ambiental / Controle da Poluição das Águas – JICA/Japão. 
  • Coordenou a partida da operação das ETES Parque Novo Mundo, São Miguel e a revitalização da ETE Suzano. 
  • Trabalhou na CSAN (Coordenadoria de Saneamento no estado de SP) onde acompanhou elaboração de Planos Municipais de Saneamento- PMS 
  • Presidente da AESABESP (2003-2005), 
  • Atua no Conselho Diretor deliberativo da ABES Nacional/Conselho deliberativo da APU 

Socióloga FRANCISCA ADALGISA DA SILVA 

  • Formada em Ciências Sociais, pós-graduada em Gestão Ambiental / Gestão de Políticas Públicas / cursando Mestrado em Gestão de Territórios (UFABC). 
  • Trabalha Na SABESP desde 1988, hoje na diretoria de sistemas regionais 
  • Forte atuação na Sabesprev (conselheira) e na APU (diretora-presidente e diretora de projetos) 

Arquiteta IRACY BIM 

  • Superior- Arquitetura e Urbanismo, 
  • Pós Graduação – Administração de Empresas,Gestão Ambiental outros cursos recentes : Analise de Fauna e Flora para o Licenciamento Ambiental e Legislação Ambiental ( Cetesb ). 
  • Experiência profissional : atualmente realiza Gestão dos processos de licenciamento ambiental ( Cetesb, DAEE, IPHAN, CONDEPHAAT, Prefeituras entre outros ), Relatórios Ambientais, 

Dra TELMA DE CASSIA DOS SANTOS NERY 

  • Médica com pós graduação em Medicina Preventiva e Social, especialização em Medicina do Trabalho e homeopatia. 
  • Medica do Trabalho da Sabesp, 
  • Medica pesquisadora da Secretaria de Estado da Saúde 
  • Desenvolve atividades na área saúde , meio ambiente e trabalho
  • Autora e co autora de trabalhos técnicos , capítulos de livros e artigos científicos na temática fatores ambientais e impactos na saúde humana. 
  • É também Conselheira da APU. 

Engª VANIA LUCIA RODRIGUES 

  • É Engenheira Civil, tem mestrado e doutorado em Engenharia Hidráulica. É Professora universitária. 
  • Trabalhou na área técnica da SABESP, tendo exercido atividades nas áreas de planejamento de sistemas de abastecimento de água, de gestão ambiental e de gerenciamento de recursos hídricos. 
  • Anteriormente trabalhou como professora na Universidade Federal de Itajubá – UNIFEI, no Centro Universitário de Itajubá – FEPI. 
  • É membro da Câmara Técnica de Educação Ambiental do Conselho Estadual de Recursos Hídricos. 
  • É educadora ambiental na área de gerenciamento de recursos hídricos.