Nas empresas ou nas universidades, mulheres vencem obstáculos e celebram vitórias nas áreas de Saneamento e Energia

Gisele Abreu, gerente do Departamento Gestão de Energia na Sabesp, e Ana Paula Silveira, tecnóloga da companhia e doutora em Energia, contam sobre suas trajetórias
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“Lugar de mulher é onde ela quiser”. É o que provam Gisele Abreu e Ana Paula Silveira, profissionais da Sabesp – Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo. Gisele é gerente do Departamento Gestão de Energia da Companhia. Ana Paula é tecnóloga na companhia desde 2013 e acaba de concluir seu doutorado em Energia pela Universidade Federal do ABC. Ambas superaram desafios em suas carreiras atuando em um setor ainda majoritariamente composto por homens, e celebram vitórias profissionais.

Desafios desde as aulas de Física

A engenheira elétrica Gisele conta que se apaixonou pelos desafios da Engenharia desde os 13 anos, quando teve contato com resolução de problemas nas aulas de Física. Desde então, o desejo de trabalhar em equipe, a curiosidade, a capacidade de inovação e a persistência sempre a moveram.

“Os desafios impostos para decifrar a associação de resistores e problemas de cálculo de diferença de potencial me atraíram. Tinha muita realização em poder compreender eventos com materialização complexa, o ‘imaginar’ era indispensável”, relembra.

“A partir dessa descoberta decidi fazer um curso técnico em Eletrotécnica e as descobertas foram me deixando ainda mais empolgada. Nunca tive dúvidas quanto a qual carreira seguir. Decidir cursar Engenharia Elétrica foi natural para mim, nunca tive outra carreira em mente”, ressalta.

Para Gisele, na Engenharia o maior desafio é promover transformações que auxiliem na solução de problemas, aumento da eficiência de processos e atendimento às necessidades. Além disso, também tem que lidar com o preconceito.

“Não posso afirmar que nunca sofri preconceito por ser mulher e atuar na área da Engenharia Elétrica, mas posso garantir que isso nunca afetou minhas decisões ou o desenvolvimento de minhas atividades. Entendo que uma das características profissionais mais desejadas para todo e qualquer profissional é o respeito e onde eu atuei sempre fui respeitada e respeitei os demais profissionais”, afirma. A Sabesp sempre contribuiu para o meu desenvolvimento acadêmico. Através da Sabesp tive ainda a oportunidade de realizar treinamento no Japão para o Controle Automático de Processo”, ressalta.

Em meio a tantos desafios, Gisele celebra vitórias. “Um projeto marcante foi a implantação do Sistema Produtor São Lourenço. Para o funcionamento deste empreendimento tão importante foi necessária a implantação da infraestrutura de distribuição de energia para o Sistema de Captação e para a Estação de Tratamento de Água”, conta.

“No caso específico para atendimento ao Sistema de Captação foi necessária a implantação de 42 km de Linha de Distribuição em 138 k e, embora a própria Distribuidora tenha sido a responsável pela execução dessa obra, foi uma grande satisfação poder ter contribuído para que a obra fosse concluída e o prazo fosse atendido”, detalha.

“Meu desafio atual é a implantação do Programa Corporativo de Geração Distribuída – Energia Fotovoltaica que promove a geração de energia fotovoltaica nas áreas da Sabesp, e inova, utilizando o mecanismo de autoconsumo remoto para abatimento do consumo nas contas da Sabesp em outra localidade, mas dentro da área de concessão da distribuidora. É um lindo projeto alinhado com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU e aos princípios de ESG”.

Doutorado, dois empregos e reconhecimento internacional

Ana Paula sempre foi apaixonada pelo tema água. “Desde a minha primeira formação, em Biologia, eu sempre enxerguei a água como algo com que eu gostaria de trabalhar. Depois, quando me formei em Saneamento na FATEC São Paulo, idem. E foi lá onde comecei a trabalhar em um grupo de pesquisa de dessalinização de água. Dentro desse estudo, o grupo percebeu que um dos maiores gargalos para fazer dessalinização era a energia elétrica. Começou então meu interesse pela área de energia”, relembra.

O principal propósito desse trabalho é produzir um dessalinizador de água movido a energia solar, para usar essa energia para aquecer a água, que vai ser evaporada e dessalinizada por meio de destilação térmica.

“Durante estes estudos, a gente identificou a necessidade de trabalhar o uso mais eficiente da energia ou um processo que demandasse menos energia elétrica. E quando comecei a pensar em fazer meu doutorado, eu enxerguei como uma oportunidade de trabalhar a eficiência energética em sistemas de distribuição de água. E foi esse o tema da minha tese”, conta.

“Meu interesse e o foco do meu estudo é o uso eficiente da energia, porque eu entendo que os recursos que a gente tem disponíveis no planeta estão cada vez mais limitados, então é importante para o desenvolvimento de novos processos ou novas tecnologias que haja sempre essa premissa de trabalhar com o uso mais eficiente possível da energia”, detalha.

Todo o trabalho de dessalinização foi desenvolvido com pouco aporte de recursos financeiros. Então o grupo foi sempre tendo que usar da criatividade para driblar essa questão. Mesmo assim, apresentaram um artigo em um congresso mundial de dessalinização, que foi realizado em 2015 em San Diego, na Califórnia (EUA). O trabalho concorreu a um dos melhores artigos apresentados no congresso.

“Para mim foi super marcante por eu, como mulher, ter ido representar esse trabalho fora do Brasil. Também em 2015, a gente lançou nosso livro de dessalinização e isso também foi muito marcante. Além de ter um artigo publicado internacionalmente, a gente ainda teve um livro publicado com o nosso esforço de compilar material, traduzir de acordo com o que a gente mesmo correu atrás e pesquisou”, relata.

“Também marcaram o ingresso e a conclusão desse doutorado em energia, porque eu cursei esse doutorado todo trabalhando em grande parte do tempo com dois empregos. Algumas pessoas duvidaram de que eu conseguiria concluir. Então, ter concluído esse doutorado, ao longo de cinco anos, ainda trabalhando com dupla jornada, como tecnóloga e como professora universitária, foi uma conquista muito marcante, especialmente pelo fato de eu ser mulher doutora em uma área que ainda tem uma presença masculina muito forte”, afirma também.

‘Cadê o professor?’

No dia a dia do trabalho, os principais desafios que Ana Paula encontra são voltados à dificuldade das pessoas em relação à mudança. Especialmente a forma de pensar, a mudança de mindset.

“Todos querem mudar, mas na hora de colocar a mudança em prática, percebe-se que ainda há diversos obstáculos a serem vencidos. E para pensar em eficiência energética, especificamente, é preciso pensar em mudanças de processo, nas operações e na forma de usar a energia”, pondera.

Entretanto, as dificuldades não são somente na rotina. A tecnóloga conta que as mulheres que atuam na área de infraestrutura e, no caso dela, especialmente no Saneamento e Energia, sofrem preconceito com uma frequência grande.

“Quando eu ministrava aulas na Engenharia Civil, especialmente nas primeiras aulas, eu entrava em sala de aula e os alunos ficavam me olhando com desconfiança e inclusive alguns até já vieram me perguntar ‘cadê o professor?’. Isso já aconteceu várias vezes comigo, muitas vezes me confundiam com uma aluna. Para mim é muito claro que é um preconceito enraizado, porque as pessoas não percebem que estão fazendo isso”, detalha.

Ana Paula lamenta que no dia a dia do mercado de trabalho ainda aconteçam casos em que, em alguma questão mais técnica, geralmente não escutem o que a mulher fala.

“Ainda é muito comum esse tipo de preconceito com a mulher. Percebo uma tendência a acreditarem que a mulher não tem competência para atuar na parte técnica ou operacional. Isso é muito comum, tanto que nas empresas da área de infraestrutura o número de mulheres é muito inferior ao número de homens trabalhando nessas áreas”. Mas ressalta que a mudança vem acontecendo. “Desde que entrei na Sabesp, sempre tive muito incentivo para estudar e me desenvolver, além de ter espaço para propor soluções novas, alinhadas a esse novo contexto de mundo, como o ESG”.

Raio X

Na Sabesp há 25 anos, Gisele é formada pela Universidade São Judas Tadeu, com MBA Executivo pela FIA-USP e MBA em Saneamento Ambiental pela FESPSP. Há 11 anos, está à frente do Departamento de Gestão de Energia da Sabesp.

Além disso, Gisele atuou em diversas áreas da empresa como manutenção na ETE Barueri e Parque Novo Mundo e na Metropolitana Sul, atuou ainda na área Comercial em Americanópolis e São Bernardo do Campo, e no Departamento de Engenharia.

Já Ana Paula é graduada em Ciências Biológicas pelo Centro Universitário Fundação Santo André, graduada em Hidráulica e Saneamento Ambiental pela Faculdade de Tecnologia de São Paulo, mestra em Tecnologias Ambientais pelo Centro Estadual de Educação Tecnológica Paula Souza e doutora em Energia pela Universidade Federal do ABC.

É tecnóloga na Sabesp desde 2013, atua como representante da ABES-SP na Comissão Interinstitucional de Educação Ambiental do Estado de São Paulo e coordenadora adjunta da câmara técnica de Educação Ambiental da ABES-SP. Atuou como docente na graduação e pós-graduação por 7 anos, é coautora do livro Ciclo Ambiental da Água: da chuva à gestão e do livro Dessalinização de água.